“Chamava-se Eva, corria descalça e tinha um sonho”, disse-lhes aquela mulher, com os olhos mais negros do mundo, a voz mais cansada e triste, recostada na poltrona mais velha da enfermaria. Deitaram-na e desejaram-lhe as boas noites.
De manhã vieram outros levantá-la e dar-lhe banho. Com a água a escorrer-lhe do rosto, disse-lhes: “Chamava-se Laura, corria descalça e tinha um sonho”. Pentearam-na, cobriram-lhe as pernas e os ombros e sentaram-na na poltrona.
Ao jantar insistiram para que comesse, abrisse mais os olhos e comunicasse com eles. Sussurrou-lhes, muito lentamente: “Chamava-se Mariana, corria descalça e tinha um sonho”.
Na ronda da noite encontraram-na morta. Tirara as meias, estava ainda quente e guardava um belo sorriso nos lábios, como quem sonha um sonho feliz.
sábado, 8 de março de 2008
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3 comentários:
Belíssimo, Renata, o teu registo de fim de vida emocionou-me imenso. Eva é tudo o que quiser, ser.
Bem construído, como sempre.
Comovente e belo. É sempre uma delícia ler-te!
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